Responsabilidade Social Corporativa, Solução para Desatinos das Filosofias Empresariais
Em
certa ocasião, minha amiga Lay escreveu
"
(...) Nos últimos anos, fatores como meio
ambiente, o tratamento dispensado aos empregados, o bom serviço prestado pelos
fornecedores e o engajamento em ações sociais passaram a fazer parte da
estratégia das empresas, que consideram tais atividades essenciais para atrair
os consumidores [... ]"
Esse
pensamento nos revela que o presente fulgor da Responsabilidade Social
Corporativa RSC não surge do (1) reconhecimento empresarial do valor intrinseco do
meio ambiente por oferecer sustento à vida; ou (2) pelo humanismo subjacente no respeito à vida do
outro enquanto colaborador, funcionário ou empregado; ou (3) por sentimento de
gratidão à humanidade pelos bens que ela oferece ao empresariado.
Internalização de
fatores morais no ambiente competitivo
A
filosofia empresarial do RSC firma-se enquanto resultante, entendo, de um impulso
central: a necessidade de resposta do capital monopolista à intensificação do
processo competitivo a partir da incorporação de novos competidores – nos países em desenvolvimento, notadamente os
asiáticos – criados com o surgimento de novas tecnologias.
Ela
equivale à busca de valorização de ‘fatores morais’, até então situados fora do
ambiente econômico, para viabilizar a ‘destruição criativa’ que, de tempos em
tempos, é desencadeada pelo capital monopolista para fortalecimento de um certo
processo de concentração de capital que lhe seja favorável.
Nessa
valorização de ‘fatores morais’ tais valores são trazidos para dentro do
ambiente competitivo, na circunstância em que os tradicionais instrumentos de
estratégia utilizados pelas empresas na competição por mercados possam não
apresentar os resultados esperados, ou seja, a manutenção de sua supremacia.
Antes
de continuar, importante destacar quais seriam tais valores morais adotados
pela estratégia empresarial. São aqueles
apresentados por Lay:
(a)
respeito ao meio ambiente,
(b) bom tratamento dispensado aos
empregados; e
(c) engajamento empresarial em ações
sociais.
Contudo,
considerando a sociedade como um todo, creio que a grande força impulsionadora
da RSC, externa às empresas, localiza-se nas demandas sociais que dão ênfase
aos ‘valores morais’ eleitos pela comunidade, inclusive internacionalmente, e
que passam sob pressão a ser internalizados no processo produtivo.
A Plataforma Verde, o Novo Sonho
Na
área ambiental, as poderosas pressões sociais, desde os anos 70 até nossos
dias, consideradas ingênuas e apolíticas, naquele início na Europa, associadas
politicamente à direita na eleição de seus primeiros políticos, confrontou-se
com a ordem estabelecida ao posicionar-se contrariamente:
(a)
ao comércio internacional irrestrito de produtos para cuja produção sejam
provocados impactos ambientais indesejáveis;
(b)
à expansão da energia atômica como fonte energia elétrica e
(c)
à devastação de florestas tropicais.
A
Europa já tinha se esquecido dessas fortes demandas sociais desde os anos 60,
particularmente as de 1968, exceto pelas pontuais greves de trabalhadores, como
por exemplo, aquelas dos trabalhadores de minas de carvão, na Inglaterra, nos
anos 80 (Era Tatcher)
e das manifestações dos agricultores franceses em prol de seus subsídios à
produção agrícola nacional, estas até recentemente. Tal como em 1968, as
presentes demandas são provenientes das classes médias, com algum poder de
mobilização, acesso a instrumentos de comunicação e formação de opinião.
Nas empresas, a busca do Corebusiness; no Setor Público, o foco no
Estado Mínimo
Por
outro lado, especificamente no ambiente empresarial, devemos considerar que,
desde meados dos anos 80 até meados dos anos 90, a ordem do dia em termos
de Filosofia Empresarial, era a REENGENHARIA, receituário que preconizara o
foco das empresas ao seu core business, isto é, a concentração nas atividades
produtivas naquele conjunto de produtos e serviços se constituíam no eixo
central de seu negócio, de seu âmbito de atuação; tudo o mais deveria ser
abandonado por meio da terceirização.
A
pedra filosofal era a idéia de que as empresas deveriam voltar-se
exclusivamente à produção daquilo para o qual teriam vantagens competitivas,
pois nas demais atividades não apresentariam produtividade suficiente e,
porisso, teriam custos maiores nessas atividades/produtos. Deveriam ser
terceirizadas todas as atividades empresariais que não constituíssem o foco.
A
Reengenharia surge em uma
Europa e nos EUA sob o ideário de Estado Mínimo, trazido pela
dupla Reagan/Tatcher, em um mundo sob o poder hegemônico dos EUA pós extinção
da URSS.
Desnecessário
mencionar o quanto a Reengenharia (a) gerou de desemprego mundo afora e (b) o
quanto criou de massa crítica desfavorável ao status quo composto por planos de demissão voluntária
nas organizações, pelo ideário e incentivo da mídia ao desenvolvimento do
próprio negócio, gerando um quadro em que o Estado, nas diversas nações, não
teve frequentemente condições de fazer frente, imobilizado pela mídia
encarregada de propalar o falso ideário criado de que o Estado atrapalha a vida
civil e o lucro e os interesses privados.
Esse
espaço deu margem ao surgimento de milhares de ONGs em todas as nações e, ao
tempo que ofereceram trabalho e renda a uma parcela dos desempregados, passaram
a ocupar parcela do espaço antes detido exclusivamente pelo Estado. As ONGs
tornaram-se fonte de poderosa pressão social contra o statu quo não somente
social, mas também e principalmente ambiental.
A
Reengenharia, enquanto filosofia empresarial ainda reside subjacente à
atividade empresarial nos dias de hoje, embora seu criador tenha manifesto
recentemente ter abandonado esse ideário.
Contradições e Descompasso entre Filosofias Empresariais
Existe
um certo consenso no interior das empresas que, depois de grande processo de
demissão, o ambiente interno das organizações fica frequentemente muito
machucado, as pessoas ficam abatidas, desconfiadas de que em breve “serão os
próximos” a serem demitidos, percebem que não há espaço para lealdade no mundo
do capital (exceto no Japão) e passam a analisar oportunidades de trabalho fora
da empresa. E, com isso, observa-se que há queda de produtividade do trabalho.
Por
essa razão, foi criada uma técnica administrativa denominada “Pesquisa de Clima
Organizacional”, destinada a capturar o pensamento das pessoas no interior das
empresas e melhor conhecer suas demandas. O reconhecimento dessas demandas
permite melhor gerenciar e influir na configuração desse clima e aprimorar seus
padrões, para viabilizar internamente a estratégia das empresas.
Antes
da Reengenharia, a filosofia empresarial dominante era a do Programa de
Qualidade Total, que apresenta muito bons resultados no entrelaçamento das
pessoas em torno do ideário produtivo organizacional.
Lastimando-se,
em particular, muitos empresários manifestam que “tinham gasto o cartucho” do
Programa de Qualidade antes de aplicarem a Reengenharia e, assim, não poderiam
aplicá-la novamente após a Reengenharia, pois não surtiria o mesmo efeito: com
a Reengenharia, havia sido traído o ideário da participação intensa de cada um
para construção de uma empresa que seria de todos, valor propalado pela
filosofia do Programa de Qualidade Total. O desemprego havia gerado anticorpos
bastante fortes para nova rodada do Programa de Qualidade.
O
Surgimento da RSC como solução para a continuidade
Contudo,
como o poder deve alisar e bater, bater e alisar, diante da falência dos
programas de Reengenharia e do caráter inócuo dos PQT nesse novo momento, as
organizações viram na RSC Responsabilidade Social Corporativa sua grande saída
para mobilização dos colaboradores. A RSC faria renascer o ideário do
compromisso social das empresas, trucidado pela aplicação da Reengenharia desde
meados dos anos 80 até por quase toda a década de 90.
A
RSC surge, assim, como resultado de (a)
forças externas às organizações – a forte pressão social em todo o mundo para
que as organizações contribuam para a construção de uma sociedade comprometida com
o bem estar, no sentido mais amplo, e com o equilíbrio do meio ambiente – e (b)
de forças internas às organizações, caracterizada pela necessidade de
mobilização dos colaboradores, funcionários e empregados para a reconstrução
das empresas ocidentais, premidas pela concorrência devastadora dos países
asiáticos (que se tornaram modelo de gestão), mas sem o mesmo poder de pressão
da massa salarial.
É
emblemático o caso da empresa NATURA, situada em segmento altamente competitivo
da economia. Cedo adotou essa filosofia e desde logo apresentou crescimento
pujante e elevação continua de seu marketshare.
O
comportamento do Estado oscilou ao longo desse tempo e não foi o mesmo de país
a país. Nos EUA imperou a desnormatização absoluta dos procedimentos e dos
controles do Estado sobre a economia como um todo e sobre as empresas em
particular, de modo às empresas partirem até para o ilícito (vide caso Eron) e
a verificar-se a desarticulação de políticas sociais pelo governo.
Nos
países europeus, por sua vez, a desnormatização foi menos radical, mas a onda
privatizante foi também intensa e não menos inibriante para desvarios das
empresas financeiras e dos investidores privados. E também na Europa foi
intenso o surgimento de ONGs e, igualmente a RSC floresceu como novo baluarte da filosofia e da política
empresarial.
No
Brasil isso não tem sido absolutamente diferente, embora na área ambiental o
País jamais tenha deixado o perfil de gestão pública ambiental de padrão
comando-controle – alvo de críticas intensas dos privatistas –, o que tem
garantido, sob o lastro da forte pressão social, o aperfeiçoamento das
condições ambientais brasileiras, evento notório quando se compara com o
grandes descaso empresarial e governamental brasileiro dos anos até o final da
década dos 80. A
Rio 92 foi um marco.
Panorama
favorável à continuidade do emprego da Filosofia de RSC
Considero
que existe algo muito importante que distingue como da água para o vinho as
filosofias empresariais, de um lado o PQT Programa de Qualidade Total e a
Reengenharia, e de outro a RSC Responsabilidade Social Corporativa: a forte
mobilização social em prol da preservação ambiental e do ambientalmente
amigável.
Essa
distinção traz muita luz no caminho das causas ambientais e esperança a todos.
Mas, somente enquanto existir essa força, penso, as empresas manter-se-ão
adeptas à filosofia RSC. Caso essa força se extinga, as organizações poderão
criar nova filosofia derivada de suas próprias necessidades organizacionais que
melhor viabilizem a acumulação de capital.
Por
enquanto, para as empresas a estratégia da RSC parece adequada (e articulada
com a atuação da ONU em prol do desaquecimento global) para o combate ao poder
competitivo da economia chinesa e dos tigres asiáticos. Devo lembrar que a Reengenharia
tinha o mesmo propósito e falhou.
Útil
até o presente por ter viabilizado o desenvolvimento empresarial, a permanência
da RSC enquanto filosofia empresarial poderá ser melhor avaliada após as
negociações do Pós-Quioto, ainda em curso neste início de 2012, em que seu
papel talvez venha a ser melhor desenhado. Joga muito em favor da permanência
da RSC, a situação mundial de premência climática e as soluções de curto, médio
e longo prazo que poderão ser oferecidas para sua mitigação. Lhe são positivas
as perspectivas, embora isso tenha correspondência com a gravidade da situação
climático-ambiental.
Nenhum comentário:
Postar um comentário